Entrevista

Continental busca parceiros para antecipar tecnologias

Frédéric Sebbagh, presidente do grupo no Brasil, comenta sobre os projetos da empresa, como o desenvolvimento da chave virtual

Por Alzira Rodriguesalzira@autoindustria.com.br

Além de iniciar a produção do ESC, sistema de controle de estabilidade, em sua fábrica de Várzea Paulista, SP, no ano que vem, o Grupo Continental segue investindo firme em novas tecnologias e na produção local de itens ainda não disponíveis por aqui. Em entrevista ao AutoIndústria, o presidente do grupo no Brasil, Frédéric Sebbagh, fala dos projetos em curso, como a busca de parceiros para o desenvolvimento da chave virtual, aquela que abre e liga o carro via aplicativo em telefone celular, e das novas tendências para o País. Também avalia o Rota 2030 e o mercado brasileiro, que acredita ficará estável neste segundo semestre.

O senhor acredita na continuidade do crescimento do mercado neste segundo semestre?
Após três anos muito difíceis, vimos uma recuperação das vendas de veículos a partir do segundo semestre de 2017, com curva ainda ascendente na primeira metade deste ano. Estamos conservadores, porém, quanto aos volumes do segundo semestre. A greve dos caminhoneiros no final de maio afetou as vendas e há dúvidas no cenário político. Além disso, há retração na Argentina e México, dois dos principais mercados para o setor. Acreditamos, assim, em um segundo semestre neutro, com estabilidade nas vendas.

Como está o desempenho do Grupo Continental?
Pode parecer estranho, mas por conta do nosso portfólio diversificado conseguimos crescer 17% entre 2014 e 2016, em pleno auge da crise. Nossas vendas para o mercado de reposição, por meio da divisão ContiTech, e também as de pneus, ampliaram-se no período, garantindo desempenho positivo. Sofremos os impactos negativos da retração da produção das montadoras, mas fizemos os ajustes necessários e hoje estamos adequados à nova realidade.

Há previsão de crescimento este ano?
Nosso faturamento no Brasil deve crescer de 3% a 5%.

Quanto o mercado de reposição representa para a empresa?
Do nosso faturamento, pouco mais de 20% vêm do mercado de reposição e cerca de 50% são negócios com as montadoras. O restante refere-se à receita com negócios de outras áreas, como a petrolífera e a de mineração. Nossas exportações têm ficado estáveis.

Como estão os investimentos do grupo no Brasil?
Tradicionalmente investimos perto de 3% em pesquisa e desenvolvimento e 5% em novas linhas de produtos, novos processos, manufatura 4.0 e afins. O desenvolvimento de novas tecnologias segue em ritmo acelerado e nós procuramos sempre nos antecipar às potenciais demandas do setor.  Dentre as principais frentes de tecnologia hoje estão os veículos autônomos, o carro elétrico e a matriz energética.

As plantas brasileiras já estão se enquadrando no contexto da Indústria 4.0?
Nossa matriz já tem várias plantas dentro do novo conceito e no Brasil caminhamos nesse sentido. Estamos investindo em robôs, nos AGVs e em sistemas integrados em nuvens, dentre outros processos. Nossa planta piloto rumo à manufatura 4.0 no Brasil é a de Guarulhos, na Grande São Paulo. Vale destacar que cada caso é um caso quando abordamos esse tema. No Brasil ainda há plantas com processos mais artesanais que vão demorar mais tempo para se adequar à manufatura 4.0.

Com relação a novos produtos, quais as novidades em desenvolvimento pelo grupo?
Iniciaremos em meados do ano que vem a produção do sistema de controle de estabilidade, ESC, em nossa fábrica de Várzea Paulista, no interior de São Paulo. Como o sistema será obrigatório em todos os novos veículos a partir de 2020 e em todos os carros a partir de 2022, teremos volumes que justificam o investimento na produção local.

Há outros projetos em curso?
Nós não investimos apenas em tecnologia que passam a ser obrigatórias, como é o caso do ESC. Também buscamos parcerias para produzir novidades aqui. Atualmente, por exemplo, pretendemos trazer para o Brasil um sistema que elimina a chave mecânica do carro. É uma chave virtual, que está no celular, uma tecnologia própria da Continental. O automóvel é destrancado e ligado através de uma aplicação no smartphone. Estamos buscando parceiros para trazê-la para cá.

Já há interessados no projeto? Seria uma parceria com montadora?
Há interessados sim. É uma questão de tempo. Mas não é um projeto ligado diretamente ao mercado original. Pode ser feito em parceria com frotistas, com locadoras, por exemplo (no final do ano passado, a Continental firmou parceria com a Avis em Kansas City, EUA, oferecendo a chave digital em 1.000 veículos da frota da locadora). Outro projeto é o câmbio autônomo para bicicletas, com sistema de rastreabilidade para ciclista. Está em desenvolvimento na fábrica de Guarulhos.

Qual a importância do Rota 2030 para o setor?
O Rota 2030 deve incentivar as montadoras a investir mais em tecnologia para desenvolver veículos mais limpos e mais seguros.

Há uma relação no Brasil entre demanda e legislação? O setor investe em novidades mesmo sem haver obrigatoriedade?
Em alguns itens, principalmente os ligados à segurança, a obrigatoriedade favorece os investimentos. Foi o que aconteceu com o ABS e o airbag e agora com o controle de estabilidade. Já no caso da conectividade, o próprio mercado tem exigido avanços.

As montadoras, então, têm incentivado a produção local de itens ligados à conectividade?
Exatamente. Há uma dinâmica do mercado que tem gerado desenvolvimentos nessa área. Um exemplo é o painel de instrumento. O mecânico está sendo substituído pelo digital. É uma tendência e estamos em contatos com os clientes para fornecer painéis de instrumento digital. O mesmo acontece com os displays e mais recentemente com o carregador de celular sem fio. Há interesse nesse tipo de tecnologia.

Voltando ao Rota 2030, haverá reflexos imediatos do programa no setor ou são medidas mais de médio e longo prazos?
No que diz respeito à segurança, o assunto já está sendo tratado por entidades do setor, como AEA e Sindipeças, a partir da resolução publicada pelo Contran que estabelece cronograma de estudos técnicos e proposta para a regulamentação de vários itens nesse quesito. Já no que diz respeito à eficiência energética, a própria demora na publicação do Rota 2030 gerou uma paralisia no setor. O que temos agora são novas normas que vão valer a partir de 2023.

Mas o programa é positivo…
Ainda é uma MP. Temos de esperar a publicação de todos os decretos e a aprovação da medida. Há incentivos fiscais para investimentos em P&D, mas as montadoras terão de ter lucro para ter os benefícios.

Como o senhor vê a questão do etanol? Vai ter espaço para o carro elétrico no Brasil?
Para chegar no carro elétrico teremos de passar pelo híbrido, que no caso do Brasil envolverá o motor flex. É certo que o País não poderá ficar defasado em relação ao resto do mundo, até porque nós exportamos e o carro limpo é uma tendência mundial.

Qual o papel da Continental nesse novo contexto da indústria automotiva mundial?
No mercado automotivo, a Continental é o maior comprador de componentes eletrônicos. Nosso foco é em tecnologia e não em produtos. Procuramos nos antecipar às tendências e, por isso, investimentos continuamente em pesquisa e desenvolvimento.


Foto: Divulgação/Continental

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Alzira Rodrigues

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