Com novos produtos e estratégias, marca ganhou quase 1 ponto porcentual, o maior avanço entre as montadoras de grandes volumes
Há exatos dez anos a Fiat liderava com folga o mercado brasileiro com mais de 24% de participação. Em 2009, Palio e Uno somaram quase 380 mil dos 740 mil veículos que a marca colocou nas ruas brasileiras. Eram, de fato, tempos menos complicados para a montadora e as três outras históricas marcas de veículos instaladas aqui.
Até o início desta década, não era coisa rara para este quarteto, que detinha 75% dos negócios, crescer 2 ou 3 pontos porcentuais na penetração de um ano para o outro. Bastava um lançamento acertado e pronto: saltos tanto no fluxo de clientes nas revendas como nas vendas concretizadas. Que o diga a própria Fiat, que apenas com o Mille alterou sua própria trajetória no Brasil no transcorrer dos anos 90.
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Mas esse quase céu de brigadeiro mudou drasticamente para a marca italiana há 3 anos, depois de perder a liderança de mais de uma década para a GM. Além da crescente participação de outras marcas em segmentos-chave para a montadora, a Fiat convivia com o fim do ciclo de vida de vários de seus veículos e, simultaneamente, com a renovação de concorrentes diretos.
A participação média de 17,7% em automóveis e comerciais leves registrada em 2015, último período à frente do ranking, recuou para 15,3% no ano seguinte, 13,4% em 2017 e bateu em 13,2% no ano passado. E isso se não fosse o prestígio de seus comerciais leves, especialmente as picapes Strada e Toro, líderes disparadas de seus segmentos. Se considerados apenas automóveis de passeio, o tombo foi ainda maior: de 14,9% em 2015, a segunda colocação, para 8,7% no ano passado, apenas o sexto lugar no ranking de marcas.
Iniciar rapidamente um trabalho para energizar novamente as vendas e inverter a curva de desempenho mercadológico, particularmente em automóveis de passeio, era premente e, desde então, essa tem sido a preocupação a nortear os maiores esforços e investimentos da montadora.
E, de fato, a atualização da linha de produtos promovida nos últimos dois anos começou a surtir efeitos mais palpáveis de alguns meses para cá. As vendas acumuladas no varejo de janeiro a outubro representaram 13,8% dos emplacamentos, 0,9 ponto porcentual a mais do que em 2018, a maior evolução dentre as marcas de grandes volumes.
Herlander Zola, diretor Brand Fiat e de Operações Comerciais da FCA, interpreta que essa reversão está diretamente relacionada com os lançamentos do Argo em 2017, do Cronos e da nova geração do comercial Ducato em 2018, com o sempre sólido desempenho das picapes e com uma sintonia mais fina na oferta de versões.
A própria contratação de Zola, em 2017, fez parte dos movimentos para revigorar os números de vendas. “Meu foco será desenvolver estratégias para adicionar valor à marca, com soluções adequadas às necessidades do consumidor”, afirmou o executivo quando de sua chegada na empresa, após passagens por Volkswagen, Audi e BMW.
Novos produtos eram importantíssimos, mas uma das missões mais imediatas do executivo, entretanto, seria reconquistar a confiança de dezenas de grupos que investiram em concessionárias Fiat e que, naturalmente, estavam desacostumados e descontentes com os negócios em baixa, ainda que boa parte deles tenha encontrado alguma compensação com a Jeep, o outro braço da FCA no Brasil, dono de produtos de maior valor agregado.
“Mudamos o nosso relacionamento com a rede de revendedores nesse período”, fez questão de enfatizar Zola nesta semana, durante a apresentação da linha esportiva S-Design para Argo e Cronos, mais um entre dezenas de eventos que a empresa vem promovendo para avivar marca e produtos na mídia e na percepção dos consumidores.
As iniciativas para melhorar essa frente mais visível de contato com o cliente final tem envolvido investimentos em vários aspectos. A comunicação visual e o próprio conceito das 520 concessionárias da marca começaram a ser alterados há dois meses, um processo previsto para estar concluído em algo como dois anos.
Simultaneamente, os próprios revendedores têm sido estimulados a criar versões digitais de suas revendas, na verdade pequenos showrooms que concentram poucos carros para test drive e muito mais monitores e dispositivos de realidade virtual.
A primeira concessionária desse tipo abriu as portas na cidade de São Paulo no fim do ano passado e, projeta Zola, até o encerramento de 2020 serão pelo menos duas dúzias espalhadas por vários estados.
Essa estratégia de aproximação da montadora com os consumidores por meio do digital ganhou mais uma ferramenta esta semana quando Zola e equipe apresentaram o Fiat Live Experience, plataforma de tour virtual.
Por meio dela, o consumidor faz visitas on-line e em tempo real aos carros da marca, guiados por quatro profissionais que apresentam as principais funcionalidades dos veículos e esclarecem qualquer dúvida técnica ou de conteúdos.
Para isso, a empresa criou também estúdio de 200 m² na fábrica de Betim (MG), onde os modelos e versões poderão ser visitados virtualmente de segunda-feira a sábado das 10h às 22 horas mediante agendamento.
“É uma ferramenta inédita no setor. Nossos objetivos também são conhecer melhor o público e conversar com ele sobre suas preferências”, confessa o diretor da Fiat.
Com mais ferramentas, rede novamente motivada com a volta dos resultados e produtos mais adequados ao momento e perfil do mercado brasileiro, Zola entende que a marca deve galgar alguns pequenos degraus na participação do mercado já em 2020 — “podemos chegar a 14%”, projeta conservadoramente o executivo — e de forma mais evidente a partir de 2021.
Afinal, a montadora prepara o lançamento da nova geração da picape Strada, prevista para chegar às lojas no primeiro quadrimestre do ano que vem, a renovação da linha de motores, com a esperada adoção do turbo até no 1.0, a oferta de novas configurações da van Ducato hoje só conhecidas na Europa e, mais importante, finalmente sua entrada nos utilitários esportivos.
Com 26% do mercado interno de automóveis, os SUVs formam o segundo maior segmento de automóveis no mercado interno, atrás apenas dos hatches pequenos (32%). Sem um representante nessa faixa, portanto, a Fiat deixa de ser alternativa para essa enorme fatia das preferências e dificilmente teria como avançar muito mais em vendas.
Partindo desse princípio, e de certa forma reconhecendo que está atrasada nessa corrida, a marca decidiu não ter apenas um, mas dois utilitários esportivos.
Zola assegura que eles chegarão às ruas a partir de 2021. O primeiro foi apresentado no último Salão do Automóvel de São Paulo, em 2018, como o conceito Fastback. Será fabricado em Pernambuco (PE) sobre a mesma plataforma da picape Toro e dos Jeep Renegade e Compass.
As informações sobre o segundo utilitário esportivo são mais escassas, mas dificilmente não será produzido em Betim e deixará de compartilhar a arquitetura do Argo.
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Todo esse planejamento, entretanto, poderá ganhar algumas correções de rumos ou até mesmo mudar de maneira drástica se confirmada a fusão global da FCA com a PSA. Impactos práticos em 2020 são pouquíssimos prováveis, mesmo em outros mercados mundiais mais relevantes em termos de volumes.
Mas o que dizer dos projetos em gestação nas operações sul-americanas dos dois grupos não revelados oficialmente e que devem — ou deveriam — ser lançados nos anos imediatamente subsequentes? Essa resposta só mesmo Carlos Tavares, indicado para CEO da fusão, poderá dar. E não agora.
Fotos: Divulgação/FCA /AutoIndústria
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