O anúncio nesta segunda-feira, 11, do fechamento das fábricas da Ford no Brasil é a conclusão de um processo que vinha sendo desenhado aos poucos e, talvez, apenas acelerado pela crise econômica global. Enquanto a concorrência tratou de atualizar e ampliar seus portfólios de veículos, nos últimos quatro anos visivelmente a montadora tirou o pé do acelerador da operação brasileira.

Desde então seus movimentos positivos têm sido tímidos, como face-lifts dos veículos locais e a apresentação de um motor. Na verdade, as notícias a respeito da empresa e da marca passaram a ser dominadas pela descontinuidade da oferta de modelos, importação de outros e, claro, do fechamento da fábrica de São Bernardo do Campo, SP, em 2019.

O encerramento das atividades da vetenana planta de 52 anos teve especial simbolismo por ter acontecido exatamente no ano em que a marca completava 100 anos do início de suas atividades aqui. Em 1919, a Ford criou uma pequena linha de montagem no Centro de São Paulo para transformar os kits que importava dos Estados Unidos em veículos que passaram a ocupar as ainda estreitas ruas dos grandes centros.

Mas a “desidratação”da planta do ABC era perceptível bem antes de outubro de 2019, quando os últimos funcionários do quadro de mais de 2,3 mil foram dispensados. Seis meses antes a montadora encerrara a produção do Fiesta, modelo compacto que nunca chegou a ter fôlego para brigar com os principais concorrentes, e anos antes concentrara a fabricação do Ka, seu veículo mais vendido no Brasil, na Bahia, ao lado do EcoSport.

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As máquinas de São Bernardo permaneceram ligadas apenas para dar conta das últimas entregas de seus caminhões, uma operação que sobrevivia a duras penas, já que mundialmente a Ford desistira do segmento há anos.

Histórica integrante das chamada Big Four, referência ao quarteto composto ainda por Volkswagen, Fiat e General Motors e que dominou o mercado brasileiro ao longo de 50 anos, a marca já vinha perdendo vendas para montadoras mais novatas aqui.

Fechou 2020 com queda de nada menos do que 36% nos licenciamentos, contra a média de 26,5% do mercado de automóveis e comerciais leves. Deteve somente 7,1% de participação e por meras 1,3 mil unidades não perdeu a 5ª colocação no ranking das marcas mais vendidas para a Toyota. Considerados apenas os carros de passeio, o recuo dos emplacamentos chegou a 39% diante de 28% da média.

A Ford já assumira, há três anos, que passaria a se dedicar mundialmente à produção apenas de SUVs, picapes e modelos de nichos específicos, como o esportivo Mustang. Sedãs e hatches vinham sendo limados gradualmente das linhas da empresa em todo o mundo — basta recordar de Focus e Fusion.

Não restava, portanto, horizonte distante para Ka e Ka Sedan. Responsáveis por 80% das vendas da Ford no Brasil, sem eles Camaçari teria de conviver com a produção de um utilitário esportivo, segmento que já reúne mais de 40 modelos no Brasil e que ganhará vários outros nos próximos dois anos.

A história, o custo e o impacto das demissões estimadas em pelo menos 5 mil trabalhadores não foram suficientes para que o board da empresa vislumbrasse outra possibilidade diante de sua estratégia global e de um mercado em crise. Para a Ford no Brasil, agora, importar é o que importa. E só.


Foto: Divulgação

George Guimarães
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