Entrevista

FPT: vocação multiplataforma em motores.

Novo presidente da FPT, Carlos Tavares, busca aumentar base de fornecimento com propostas em combustíveis alternativos

Carlos Tavares ainda se encontra em um período de aprofundar conhecimento a respeito de seus novos desafios ao assumir a presidência da FPT Industrial para a América Latina, em 1º de maio, no lugar de Marco Rangel, que partiu para Turim, Itália, para cuidar de gestão estratégica de clientes da FPT. Tavares traz a experiência comercial adquirida na Iveco para a fabricante de motores do Grupo Iveco.

O executivo chega com o propósito de ampliar base de clientes e reforçar ofertas vocacionadas e inseridas no ecossistema do cliente, casos dos motores a gás e a etanol. “Nossa missão é entender demandas e necessidades com soluções financeiras atrativas”, resume. Em entrevista ao AutoIndústria, o executivo conta parte de seus novos compromissos e o que espera com recentes desenvolvimentos para atender ao mercado.

Ao assumir a FPT o senhor anunciou como uma das prioridades aumentar a atuação nos OEMs. Como se encaminhará essa estratégia?

É a continuidade de uma filosofia já presente na empresa. Além do fornecimento para marcas primas, vamos dizer assim, como Iveco, Case e New Holland, estamos também presentes em importantes parceiro, casos da Volkswagen Caminhões e Ônibus, da LS e da Horsch na área agrícola e outras mais. Mas vale lembrar que há novos players chegando que precisam aumentar conteúdo nacional em seus produtos para se adequaram às regras do Finame. Ampliar o portfólio de clientes é uma as grandes missões da FPT. As marcas primas são clientes muito importantes, nosso maior volume está conectado a isso. O Rangel (Marcos Rangel, antecessor de Carlos Tavares na FPT) fez um trabalho muito bem-feito, com base sólida de produtos e infraestrutura de engenharia pronta para atender os clientes. Agora, a gente de ampliar a carteira.

Na operação da FPT, quanto representa cada segmento em que atua entre automotivo, geração de energia e agrícola?

Ainda estou colhendo esses números. Mas de maneira geral, globalmente, 60% dos motores não são absorvidos pelo Iveco Group. Temos de lembrar que a CNH, com o spin-off (as marcas voltadas ao segmento rodoviário se tornaram Grupo Iveco no início de 2022) se tornou um cliente externo. Dentro da Iveco Group, há a Iveco Bus, a Iveco Truck e a área de defesa, negócios onde a FPT participa com 40% do total do volume. Quando falamos em faturamento, 50% vêm do que chamamos de on road (caminhões, ônibus) e os outros 50% dos ramos agrícola, construção e geração de energia. Na região da América Latina, seguem os mesmos porcentuais.

Como é a operação da FPT na região da América do Sul? Há um modelo de negócio baseado na complementaridade de produtos entre as fábricas da Argentina, em Córdoba, e do Brasil, em Sete Lagoas (MG)?

A fábrica de Sete Lagoas é muito focada nos leves, enquanto a da Argentina no motor para pesado. O Cursor 13, por exemplo, está localizado na Argentina. A produção na Argentina traz benefícios, porque tem a fábrica da Iveco, de caminhões e ônibus, e da CNH, de máquinas. Existe uma demanda local de motores que temos de suprir. Se tivéssemos somente a operação no Brasil, estaríamos somente exportando, eles importando e tendo de pagar em dólar. Esses clientes estariam sendo penalizados pela dificuldade de pagar em dólar e as vendas seriam menores. Ter a fábrica de motores perto de nossos principais clientes lá, ajuda no volume de venda deles. Na balança comercial praticamente zeramos o impacto do câmbio com as exportações dos motores leves e a importação do pesado.

Na recente Agrishow, a FPT apresentou um conceito de motor a etanol. O que se espera desse produto?

Não é um conceito, já é realidade, em processo de homologação da nossa engenharia. Ainda é chamado de conceito, porque se encontra em processo de calibração. Os princípios básicos desse motor são oriundos do gás e já sólidos. Também a CNH Industrial está no projeto, ajudando nas homologações e nos testes, porque se trata de aplicar em operações severas, nas quais as máquinas funcionam 24 horas. A gente precisa estar 1000% seguro. Estimamos que até o fim do ano tudo estará pronto para ser oferecido comercialmente. Estamos confiantes no final dessa história

A prioridade de aplicação para esse motor é no segmento agrícola?

É no agrícola por conta das usinas. Temos no Brasil mais de 100 usinas de grandes empresas, com potencial de mais de 1 mil motores ao ano. É um número expressivo ao se considerar somente a indústria sucroalcooleira.

No passado, ocorreram experiências do etanol em veículos pesados que não foram para frente. Por que agora é viável e no passado não foi?

Tem uma explicação muito simples. Adaptações em cima do motor a diesel podem funcionar, mas nunca entregam o desempenho de um projeto original feito para determinado combustível. A FPT desenvolveu um motor quatro tempos, próprio para funcionar com gás ou com etanol, a depender dos ajustes. A receita de ter um motor de ciclo Otto é um grande diferencial em relação qualquer outro motor do mercado. Não é um motor diesel adaptado. Trata-se um novo desenvolvimento.

Qual é o status da rota de motores a gás da FPT? A Iveco, por exemplo, já tem propósito firme na oferta caminhões e ônibus a gás.

A FPT tem um motor flex para o gás. Não trabalha apenas com o gás de origem fóssil, mas também com biogás. Nesse aspecto, a FPT foi além, porque também oferece grupo geradores a gás. O pequeno produtor pode aproveitar dejetos de animais para obter biogás e, assim, gerar energia elétrica ou abastecer o trator, o caminhão. É economia para ele. Com um pequeno investimento, esse produtor rural fica livre de fornecimento externo de energia, com custo operacional muito abaixo do cobrado pela companhia de energia e na bomba de combustível. Depois, há um movimento muito forte para instalação de infraestrutura de abastecimento nas rodovias, mandatório para ampliar a participação do gás no transporte.

As ofertas de motores movidos a combustíveis alternativos encaminham a ideia de autossuficiência em energia? O cliente procura por isso?

A ideia é exatamente essa. A cana avança pelo interior de São Paulo, Norte do Paraná e Oeste do Mato Grosso. Também o Nordeste é um polo bastante robusto em usinas. Essas regiões, com certeza, se beneficiarão do etanol. Outras regiões, no Sul, por exemplo, forte na produção de proteína animal, ou mesmo no Sudeste, a tendência é o gás. Nossa missão é entender demandas e necessidade para ajudar o cliente com os motores e solução financeira mais atrativa.

Qual é visão da FPT em relação à eletrificação?

A FPT entende ser mais uma opção para o cliente, OEM ou não. A eletrificação é um fato e vai acontecer também no Brasil e na América do Sul. Aliás já está acontecendo, mas tem sua própria velocidade. Os componentes têm custos mais altos e, um dos principais desafios é a infraestrutura, capacidade para poder carregar uma frota de caminhões sem derrubar a energia do bairro. O elétrico é uma solução sem volta e já está disponível. Algumas unidades da Daily elétrica rodam no Brasil com motor FPT. Globalmente, a FPT investe por ano na faixa de € 300 milhões em desenvolvimento, ao menos 20% são dedicados aos componentes elétricos, como baterias, eixos e powertrain. Os outros 80% são para motores a gás, etanol e evoluções dos próprios motores a diesel.

Mas diferentemente de outros momentos da indústria, hoje, muitas decisões globais consideram características regionais. Isso não coloca o elétrico ainda mais longe para o Brasil?

Por isso que a FPT é multiplataforma. Uma das grandes vantagens é flexibilidade, está no DNA. Temos um time muito bom para identificar a demanda do cliente e propor soluções que se encaixam exatamente onde ele precisa. Por isso que a diálogo com as montadoras é um grande foco. São elas que criam volume. Depois, as distribuidoras de peças vão trabalhar com o que foi colocado no mercado, a parte dois do trabalho.


Foto: FPT /Divulgação

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Décio Costa

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