Transição energética acelerada tem mostrado que não foi a melhor decisão em boa parte do mundo. Por aqui, a GM confirmou produção de híbridos; a Kia começou a oferecer seu primeiro elétrico; e o Brasil tem enorme potencial para o hidrogênio.
“Pressa é inimiga da perfeição”. Frase atribuída ao escritor Machado de Assis, que a cunhou de uma forma mais culta, pode se aplicar ao atual cenário mundial. Os carros elétricos despertaram atenções, programas apetitosos de incentivos governamentais e ocuparam parte relevante (em torno de 40%) do maior mercado de veículos do planeta, o chinês, do alto de seu 1,4 bilhão de habitantes.
Entretanto, há claros sinais de recuo em vários países da Europa e uma “meia-trava” nos EUA, segundo maior mercado mundial. A maioria dos fabricantes parece ter concluído, somente agora, que a transição precisa ser feita com menos açodamento. Alguns deles foram pegos de surpresa ao apostarem tudo numa rápida transição e sem terem dado a devida atenção aos semi-híbridos, híbridos e híbridos plugáveis.
Boa parte dessa falha estratégica foi patrocinada por um regime de estímulos inadequado. Países europeus refizeram as contas por afetar o equilíbrio fiscal. O Brasil até que não errou tanto, embora isso se deva em parte à oferta de motores flex que diminuem as emissões de CO2, quando se abastece o tanque com etanol. Embora estes respondam por 80% das vendas, apenas 30% usam regularmente o combustível de origem vegetal. Ainda falta, portanto, avançar e os híbridos deveriam receber uma atenção maior.
De qualquer forma os semi-híbridos e híbridos crescerão aqui a partir de lançamentos neste e nos próximos anos. É preciso dar tempo até a chegada dos híbridos plugáveis. E investir em uma rede de recarga rodoviária para elétricos, o que exige altos investimentos e um retorno financeiro muito baixo em um país de grande extensão territorial como o Brasil.
Este montante responde por quase 80% do total que a empresa desembolsará entre 2024 e 2028. Dois executivos da matriz, em Detroit (EUA), Rory Harvey e Shilpan Amin, vieram ao País para confirmar o investimento no Estado. Para completar os R$ 7 bilhões já anunciados, R$ 1,2 bilhão vai para a fábrica de Gravataí (RS) e R$ 300 milhões para a unidade de motores em Joinville (SC). Santiago Chamorro, presidente da GM do Brasil, confirmou que dois modelos híbridos “leves” (tecnicamente semi-híbridos) estrearão em breve, sem citar datas.
É possível que pelo menos o primeiro deles estreie em janeiro de 2025, quando a fabricante completa um século de atuação no País. Provavelmente caberá ao Tracker e ao Onix, nesta ordem, a primazia. Também um novo SUV compacto está previsto para Gravataí. Ainda em 2024 é esperada a importação do México do elétrico Equinox, em outubro próximo, que complementará o Blazer VE apresentado em julho passado e com preço a ser anunciado nos próximos dias.
Também chegará a vez dos híbridos flex, uma tecnologia mais cara, ainda sem previsão de data. Híbridos plugáveis a gasolina ficarão para o final do atual ciclo de investimentos ou do próximo.
Estatísticas de comercialização do mês passado foram afetadas por um dia útil a menos do que julho. Foi um recuo de apenas 1,6%. Ainda assim, o acumulado de vendas de janeiro a agosto de veículos leves e pesados atingiu 1,622 milhão de unidades ou 13,4% a mais que o mesmo período de 2023. José Andreta Jr., presidente da Fenabrave, apesar de manter o otimismo ressalva que “alguns fatores ainda podem movimentar o setor, como as taxas de juros, que se aumentarem podem impactar nos financiamentos de veículos como automóveis e comerciais leves”.
A consultoria brasileira Bright, em relatório apresentado no recente Congresso Fenabrave, apontou algumas tendências em curso com uma visão geral positiva. Algumas delas:
Primeiro modelo 100% elétrico da Kia no Brasil acaba de estrear. Com dimensões externas para se posicionar como um SUV familiar (4.615 mm de comprimento, 1.875 mm de largura, 1.715 mm de altura e cômodo entre-eixos de 2.750 mm), o EV5 dispõe de predicados técnicos apreciáveis, como alcance médio de 402 km, padrão Inmetro. Seu estilo é contemporâneo e o pacote ADAS incorpora nada menos do que 14 dispositivos de segurança ativa. Outros destaques: amplo espaço interno e bom acabamento. Ótimo porta-malas: 513 litros.
EV5 utiliza um único motor com potência de 217,5 cv e torque máximo de 31,6 kgf·m, alimentado por bateria de fosfato de ferro e lítio, montada com módulos em lâminas, de capacidade máxima de 88,16 kWh. Pode ser recarregado em corrente contínua (DC) de 360 kW, o que garante carga de 20% a 80% em apenas 27 minutos. Já em corrente alternada (AC) de 7 kW, precisa de 9h40m. Acelera de 0 a 100 km/h em 8,9 s.
O consumidor que adquiri-lo receberá um carregador residencial de emergência de 7 kW e gratuidade nas três primeiras revisões (20.000, 40.000 e 60.000 km). Por dentro, painel e multimídia formam uma tela única de 29,9 polegadas de ótima resolução. Chama atenção o banco do passageiro com extensor lateral em direção ao motorista, sobre o console, que tem a função lúdica de criar um “lounge interno”.
Num primeiro contato em trecho de estrada nos arredores de Itu (SP), mostrou dirigibilidade virtuosa. Tudo isso herdado principalmente do bom acerto de suspensão e desempenho impactante de todo elétrico, embora alguns concorrentes ofereçam motor mais potente, quase sempre desnecessário.
Preço: R$ 399.990.
A transição energética representa uma chance única para o Brasil se posicionar entre os líderes mundiais nos próximos anos. Afirmação de Thiago Lopes, coordenador de projetos no RCGI (sigla em inglês para Centro de Pesquisas de Inovações sobre Gases de Efeito Estufa) e professor da Poli-USP, no seminário organizado pela Carcon/Global Data, em São Bernardo do Campo (SP).
Gás carbônico (CO2) em níveis elevados demais tornou-se inimigo público mundial. Representa o principal vetor para o chamado efeito estufa, fenômeno de aquecimento atmosférico e suas consequências como derretimento de calotas polares e subida do nível dos mares. Automóveis e veículos comerciais não são os maiores responsáveis, porém, têm peso estimado em até 25% quando se calcula da fonte à roda.
Principal alternativa é o hidrogênio (H2), considerado combustível do futuro. Para Lopes, “a relevância do H2 produzido a partir do etanol atingirá um preço competitivo e no ciclo fonte à roda se tornará um combustível com intensidade negativa de carbono”.
Entretanto, torna-se muito difícil prever quando a era do hidrogênio realmente se tornará realidade, pois depende da matriz energética de cada país. Da eletrólise da água (H2O) também se obtém hidrogênio, mas exige enorme consumo de energia elétrica e esta precisa ser obtida de forma limpa como em hidroelétricas ou a partir do sol e vento.
Lopes citou o projeto da USP que testa um ônibus movido a H2, obtido a partir do etanol, em alternativa ao diesel com redução significativa de monóxido de carbono, hidrocarbonetos e óxidos de nitrogênio, além de alcançar o dobro de eficiência. No mundo, o Toyota Mirai é o único modelo com motor a combustão interna abastecido com H2, porém sua venda é simbólica e o reabastecimento, bastante limitado.
Fotos: Divulgação
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