Por Alzira Rodrigues e George Guimarães | autoindustria@autoindustria.com.br
São quatro os pilares básicos para ser vitorioso na área de distribuição de veículos: ter capital, expertise, um bom produto e fomentação. Essa pelo menos foi a receita revelada por Alarico Assumpção Jr, presidente da Fenabrave, quando questionado se vender automóveis e caminhões no Brasil é um bom negócio na atualidade. “Se tiver tudo isso, sim. Mas tem que antes de tudo ter paixão pelo que faz”.
Na semana em que AutoIndústria comemora seu primeiro ano, Assumpção Jr. concedeu ampla entrevista, na qual aborda a pior crise vivida pelo setor, o atual estágio da rede, as novas tendências na área de distribuição e as proejções para o mercado.
O setor enfrentou recentemente crise sem precedente no País. Quais os reflexos na atividade?
Se pegarmos o histórico do setor automotivo no Brasil, com certeza os anos de 2015 e 2016 foram os mais difíceis para todos os envolvidos no negócio. Nós, os concessionários, temos a responsabilidade de estarmos à frente da distribuição, um segmento tão importante como o de produção ou qualquer outro. Já tivemos vários altos baixos no Brasil, pelas próprias características do País, pelas inconstâncias políticas. Em virtude da última crise, muitas concessionárias foram fechadas e perdemos um grande número de empregos. Foram fechadas cerca de 167 mil vagas.
Mas há algum rescaldo positivo desse período? Ainda é um bom negócio vender carro no Brasil?
Sem dúvida os concessionários estão mais maduros. Houve um aprendizado muito grande, hoje há uma consciência mais clara da importância de melhorar a gestão. Na verdade, é um movimento que já dura uma década, ou seja, foi iniciado em 2008 com a falência do banco de investimento Lehman Brothers. Embora em menores proporções, aquela crise também atingiu o Brasil e exigiu uma nova postura dos concessionários frente ao seu negócio.
Hoje há uma consciência mais clara da importância de melhorar a gestão
Mas, enfim, é ou não um bom negócio vender veículos aqui?
Tem alguns pilares básicos para garantir um bom resultado na área de distribuição. Primeiro é preciso ter capital. E não é pouco. Segundo é ter expertise ou contratar talentos para todas as atividades envolvidas na concessionária. Outro ponto fundamental é a escolha de um bom produto. Por fim, fomentação. Tem de ter financiamento para o cliente. Se tiver tudo isso é um bom negócio. Mas tem que antes de tudo ter paixão no que faz.
A crise internacional de 2008 acabou sendo uma preparação para a crise interna enfrentada nesta década?
Com o aprendizado de 2008, os concessionários passaram a ter uma visão mais profunda do negócio. Investiram em gestão e em melhorias focadas na sua atividade-fim. Quem atua em segmento agrícola ou de veículos pesados tem de ter postura diferente de quem vende carro. Caminhões, por exemplo, é uma venda programada. Já no caso do automóvel, o showroom ainda é de grande importância.
Qual o perfil da rede brasileira hoje? Continua sendo um negócio familiar?
Perto de 70% da rede ainda estão em mãos de famílias. Muitas concessionárias fecharam por conta da drástica queda das vendas e outras mudaram de titularidade. Assim como teve quem ampliou negócios na crise, passando a operar novas concessionárias ou novas marcas.
Ainda há interesse de grupos estrangeiros em disputar o mercado brasileiro?
A crise afetou a todos, mas acredito que pode sim ter investimento estrangeiro. A tendência é ter novas fusões na rede.
O saneamento da rede já foi concluído?
Não acredito em novos fechamentos de empresas, mas em adequações. O processo de concentração para ganhar volume é inevitável. Essa é a lógica do negócio. Maior volume significa redução dos custos de administração e dos gastos em geral.
O showroom ainda é de grande importância
Quantas concessionárias tem hoje no País?
Em 2014 eram 7.330, hoje são 6.108. Saíram do negócio 1.926 e entraram 704 novas. Como aconteceu nos Estados Unidos, não deveremos retomar o número de lojas de antes quando o mercado recuperar os volumes recordes de 2012/2013. É o processo de concentração, da busca por maior volume por loja.
Como a internet influencia a rede e o consumidor?
Esse tema é bastante amplo. Quando falamos em compartilhamento de veículos e carros elétricos, por exemplo, vislumbramos cenários diferentes para localidades diferentes. Acreditamos que em países como Estados Unidos, Alemanha, Coreia do Sul e Japão essa realidade acontecerá antes e, vale dizer, em alguns centros urbanos, não de forma genérica. No Brasil, tanto o compartilhamento como o carro elétrico demandarão mais tempo. Algo semelhante deve acontecer com a distribuição.
Mas, por exemplo, compraremos carros apenas pela internet e o receberemos em casa?
É certo que em vinte anos teremos um cenário totalmente diferente do atual. E os concessionários brasileiros já estão se preparando para o futuro. Quanto ao que vai efetivamente acontecer, é esperar para ver. Mas não acho que o showroom vai acabar. Veio a TV e o rádio não perdeu a importância. O que teremos no setor de distribuição é uma modulação. As lojas, fisicamente, terão outra dimensão. Não precisaremos estar em áreas caras e os showrooms serão menores.
Qual a importância da aprovação do programa Rota 2030 para o setor?
É importante para dar segurança a todos os envolvidos, garantir novos investimentos. Com regras claras, há maior confiança para a aprovação de novos projetos.
A confiança é o principal ingrediente para o nosso mercado
Como o senhor avalia o comportamento do mercado este ano?
Acabamos de rever nossas projeções. A greve dos caminhoneiros afetou a confiança do consumidor e os jogos da Copa do Mundo prejudicaram as vendas de automóveis e comerciais leves. Por isso estamos apostando agora em alta de 9,7% nesse segmento, ante os 15,2% anteriores, o que representará cerca de 2,38 milhões de emplacamentos. Já no caso dos caminhões, a demanda pelos pesados está elevada e acreditamos agora que o segmento como um todo crescerá 24,8%, para 65 mil licenciamentos. A projeção anterior era de 17%.
As eleições deste segundo semestre podem afetar o mercado?
Ano eleitoral é sempre difícil e particularmente em 2018 estamos convivendo com períodos de altos e baixos. A confiança é o principal ingrediente para o nosso mercado e sempre que ela é afetada, como aconteceu a partir da greve dos caminhoneiros, há uma tendência de retração. Mesmo com a blindagem da economia, que foi bastante comentada no primeiro semestre, a política tende a refletir no comportamento do mercado.
Qual a sua aposta para 2019?
Acredito que 2019 será melhor do que este ano. Como disse, a confiança é o principal ingrediente para a retomada e a partir das eleições a poeira deve baixar. É claro que ainda há muitos problemas a serem resolvidos. O desemprego continua elevado e necessitamos das reformas, como as da previdência, política, fiscal e tributária, que precisam se encaminhadas, assim como a questão da educação, fundamental para o desenvolvimento do País.
Foto: Divulgação/Fenabrave
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